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O que faz de mim um leitor


Os livros fazem parte da minha vida há mais tempo do que sou capaz de lembrar. Por vezes eu já tentei lembrar do momento exato em que os livros se tornaram importantes para mim. A sensação que tenho é a de que eles simplesmente apareceram e foram ficando, conquistaram espaços e decidiram que não iriam embora. 


Lembro de ganhar os quatro primeiros livros da saga Harry Potter aos dez anos e lembro de ter ficado muito feliz com o presente. Mas quando penso no livro que me fez gostar de ler, o primeiro livro que me vem à cabeça é um dos favoritos da minha mãe: Dom Casmurro, do Machado de Assis. Por influência dela, eu li quando ainda estava na terceira série. Lembro de ter lido para deixá-la feliz. Não lembro quanto tempo levei para ler, não lembro de ter gostado ou não da história, mas lembro claramente do dia em que a minha mãe me entregou o livro. 


É engraçado como nos apegamos a coisas tão pequenas, coisas que em um primeiro momento passariam despercebidas, coisas que logo seriam esquecidas, mas, pelo contrário, ficam gravadas na memória. E, em momentos aleatórios da nossa vida, voltam a nossa mente e nos enchem de emoções. 



Há livros que eu não consigo lembrar da história, não consigo lembrar dos personagens, ou mesmo lembrar do nome do autor sem consultar a capa. Ao mesmo tempo, sou capaz de lembrar exatamente do que senti ao ler cada um dos livros que estão na minha estante. Lembro dos livros que me decepcionaram, daqueles (poucos) livros que abandonei, daqueles que fizeram me rir e que me fizeram chorar... Lembro dos que ganhei, lembro do que me fez comprar cada um. Mas quando penso na história, é como se as páginas, desses mesmos livros, estivessem em branco. 


Com a mesma intensidade, sou capaz de descrever em detalhes a história de alguns livros da minha estante. Não necessariamente por ter me apaixonado pela história ou por ter me tornado fã do autor e dos personagens. Há livros que eu lembro todos os detalhes e que me fizeram detestar a história ou sentir que ele não foi escrito para mim. Posso dizer que, mesmo aqueles livros que não se tornaram os meus favoritos, tiveram força o suficiente para deixar uma lembrança, uma recordação para que não ficassem para trás



Acredito que essa é a mágica por trás da leitura. Quando nos deixamos levar pelas páginas de um livro, somos carregados para realidades diferentes, somos jogados em um mundo novo, com desafios para enfrentar e histórias que, algumas vezes, nos ajudaram a entender a nossa própria história. Não sei qual o seu tipo de livro favorito. Não sei se você gosta de não-ficção ou se você se entrega a um mundo fantasioso. Não sei se você prefere distopias ou um romance estilo sessão da tarde. O que eu sei é que, se você se tornou um leitor, foi porque em algum momento da sua vida você escolheu viver nas palavras de outra pessoa por um curto espaço de tempo. Você abriu o seu coração para receber o que aquele amontoado de páginas tinha a dizer. Pode ser que um livro não tenha tocado o seu coração da mesma forma que os outros, mas você escolheu abrir a sua vida para o desconhecido. E isso requer coragem. Há livros que podem nos destruir em um momento, ao passo que outros podem nos tirar do fundo poço e nos ajudar a seguir em frente. 


E ainda assim, ouviremos aqueles que acham que a Literatura é uma bobagem ou que um determinado tipo de leitura é melhor que outra. O que muitos não entenderam, até hoje, é que a leitura é mais do que o mundo dentro da bolha em que vivem. Para mim, a Literatura sempre serviu como um refúgio, um lugar para me ajudar a seguir em frente quando eu não conseguiria sozinha. Para alguém, pode ser um ato de resistência. Para você, pode ser apenas um momento de descanso depois de um dia cansativo de trabalho ou estudos. A Literatura é aquilo que nos conforta e nos dá o impulso para ir além. 


O que me instiga a ler mais, pode não fazer sentido para você. Ao mesmo tempo, o que te move pode não servir para mim. Essa é uma das regras básicas da vida. Quando as pessoas aprenderem a não julgar a vida dos outros pelas regras da própria vida, teremos um mundo melhor. Um mundo onde a empatia não é sinal de fraqueza. Um mundo em que a sua felicidade não depende da desgraça do outro. Ou será que é sonhar alto demais que isso poderá acontecer algum dia?

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